Diretivas antecipadas: instrumento que assegura a vontade de morrer dignamente

AutorTiago Vieira Bomtempo
CargoEspecialista em Direito Público pelo Instituto de Educação Continuada - PUC Minas, Brasil. Bacharel em Direito pela Faculdade Mineira de Direito da Pontifícia Universidade Católica de Minas Gerais, Brasil. Membro da Comissão de Bioética e Biodireito da Ordem dos Advogados do Brasil, seção do Estado de Minas Gerais, Brasil. Biotécnico.
Páginas22-30

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1. Origem e conceito de diretivas antecipadas

Frente aos grandes avanços na Medicina, principalmente com o desenvolvimento de tratamentos que visam prolongar o evento morte, discute-se acerca do direito do paciente em manifestar a sua vontade em relação a estes em situações de incapacidade.

Corrobora-se, assim, a possibilidade de se constituir um instrumento que conste o interesse ou não do indivíduo em se submeter a terapêuticas médicas, o qual tenha validade caso o paciente esteja incapaz de manifestar a sua vontade.

Neste sentido, surgiu as Diretivas Antecipadas, que se vinculam a possibilidade do paciente manifestar previamente sua vontade acerca de quais tratamentos médicos quer ou não se submeter caso futuramente estiver em estado de incapacidade.

As Diretivas Antecipadas, denominadas de Advences Directives, estão previstas na PSDA - The Patient Self-Determination Act ou Ato de Auto-Determinação do Paciente, lei aprovada pelo Congresso dos Estados Unidos que entrou em vigor a partir de 1º de dezembro de 1991.

Esta lei reconhece a recusa do tratamento médico, reafirmando a autonomia do paciente, em que da sua entrada nos centros de saúde, serão registradas as objeções e opções de tratamento em caso de incapacidade superveniente do doente. Estas manifestações de vontade, diretivas antecipadas, são realizadas de três formas: o living will (testamento em vida), documento o qual o paciente dispõe em vida os tratamentos ou a recusa destes quando estiver em estado de inconsciência; o durable power of attorney for health care (poder duradouro do representante para cuidados com a saúde), documento no qual, por meio de um mandato, se estabelece um representante para decidir e tomar providências em relação ao paciente; e o advanced core medical directive (diretiva do centro médico avançado), que consiste em um documento mais completo, direcionado ao paciente terminal, que reúne as disposições do testamento em vida e do mandato duradouro, ou seja, é a união dos outros dois documentos.

O termo living will, cuja tradução literal para o português corresponde a "testamento vital", surgiu nos EUA, em 1967.2O testamento vital prevê os procedimentos médicos aos quais o paciente não gostaria de se submeter, se algum dia estiver incapaz de manifestar sua vontade, seja por estar inconsciente ou por estar em um estado terminal3, do qual poderá decorrer a incapacidade.

Segundo Roxana Brasileiro Cardoso Borges,

[...] O testamento vital é um documento em que a pessoa determina, de forma escrita, que tipo de tratamento ou não-tratamento deseja para a ocasião em que se encontrar doente, em estado incurável ou terminal, e incapaz de manifestar a sua vontade (BORGES, 2001, p.295).

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Entrementes, critica-se o termo "testamento vital", devido ao sentido de testamento no Brasil. Visto que este instrumento trata-se de um ato unilateral de vontade, com eficácia pós morte, não seria a nomenclatura correta, considerando que o testamento vital possui eficácia em vida.

Adota-se, portanto, a nomenclatura "declaração prévia de vontade", sugerida por Luciana Dadalto Penalva, para quem:

Encontrar um nome adequado não foi tarefa fácil, inicialmente pensou-se em adotar "instruções prévias", terminologia utilizada na Espanha, contudo, descartou-se esse nome por entender-se que ele não é fidedigno ao instituto, vez que não permite uma ideia do que significa tal documento. Posteriormente, pensou-se em "declaração de vontade do paciente terminal", em virtude desta nomenclatura possibilitar um entendimento apriorístico do que seja o instituto, entretanto, esta nomenclatura foi descartada por causar a impressão de que era um documento feito por um paciente terminal. Assim, com base nestes argumentos, chegou-se ao nome "declaração prévia de vontade do paciente terminal", por meio da verificação de que o documento comumente chamado de "testamento vital" é, na verdade, uma declaração de vontade que será utilizada pelo paciente terminal, mas que deve ser manifestada previamente à situação de terminalidade (PENALVA, 2009, p.16).

Assim, verifica-se que as Diretivas Antecipadas e suas modalidades têm constituído-se como importantes instrumentos de manifestação da vontade do indivíduo, dando-se primazia a sua autonomia privada e a sua dignidade, evitando que esse seja submetido a tratamentos médicos indesejados mesmo quando inconsciente ou incapaz.

2. Relação médico-paciente e diretivas antecipadas nas situações de terminalidade da vida

A relação médico-paciente consiste precipuamente em um contrato de prestação de serviços, no qual são estabelecidos direitos e obrigações entre as partes, em que o profissional médico, via de regra, utilizará de todos os recursos e meios necessários para restabelecer a saúde do paciente que requer os seus cuidados.

Maria de Fátima Freire de Sá (2005, p.34-35) pontua que a relação médico-paciente estabelece entre ambos um vínculo contratual, ato jurídico perfeito, de obrigações de resultados ou obrigações de meios.

Ocorre que esta relação vai além de um vínculo contratual, pois os deveres do médico para com o paciente devem ser sempre pautados na...

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