As marcas não tradicionais, um novo paradigma no Direito da Propriedade Industrial. A jurisprudência recente: O caso Christian Loubotin vs Yves Saint Laurent

AutorJoana Mota
CargoAbogada del Área de Mercantil de Uría Menéndez (Lisboa).
Páginas140-145

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Introdução

A marca é um sinal distintivo do comércio que identifica no mercado os produtos ou serviços de uma empresa, distinguindo-os de outras empresas, podendo ser «constituída por um sinal ou conjunto de sinais suscetíveis de representação gráfica, nomeadamente palavras, incluindo nomes de pessoas, desenhos, letras, números, sons, a forma do produto ou da respetiva embalagem, desde que sejam adequados a distinguir os produtos ou serviços...», como determina o artigo 222.º, n.º1, do Código da Propriedade Industrial, aprovado pelo Decreto-Lei n.º 36/2003, de 5 de Março, conforme alterado («CPI»).

Esta definição foi sofrendo mutações, na medida em que as empresas, na decorrência da sua crescente internacionalização e no aumento da concorrência, sentiram a necessidade não só de criar novos produtos e novas de formas de oferecer serviços, mas também de adaptar e criar novas maneiras de identificar esses mesmos produtos e serviços.

Assim, passámos de um elenco de marcas passíveis de registo muito restrito no CPI de 1940, limitado a um «sinal, ou conjunto de sinais nominativos, figurativos ou emblemáticos» (cfr. art. 79.º), para um progressivo alargamento do catálogo com a publicação do CPI de 1995, onde já se mencionavam explicitamente os «sons, a forma do produto ou da respetiva embalagem» (cfr. art. 165.º), numa formulação idêntica à que hoje consta do CPI de 2003, a qual não exclui, num elenco meramente exemplificativo, outras tipologias de marcas.

O normativo nacional está em sintonia com a Dire-tiva 2008/95/CE do Parlamento Europeu e do Conselho, de 22 de Outubro de 2008, que harmoniza as legislações dos Estados-membros em matérias de marcas (in JO L 299, de 8 de Novembro de 2008), («DM»), que dispõe no seu artigo 2.º que «podem constituir marcas todos os sinais suscetíveis de representação gráfica, nomeadamente as palavras, incluindo os nomes de pessoas, desenhos, letras, números, a forma do produto ou da respetiva embalagem», e bem assim com o artigo 4.º do Regulamento (CE) n.º 40/94 do Conselho, de 20 de Dezembro de 1993, sobre a marca comunitária (in JO L 11, de 14 de Janeiro de 1994) («RMC»).

O atual CPI prevê assim, para além das marcas figurativas, nominativas (também designadas «verbais») e mistas, que habitualmente se designam por marcas tradicionais, outros sinais que são à partida igualmente registáveis, desde que respeitem os dois requisitos da possibilidade de representação gráfica e da adequação a distinguir a proveniência dos produtos e serviços que assinalam, aplicáveis às marcas tradicionais. São as chamadas marcas não tradicionais ou não convencionais.

No entanto, e como teremos oportunidade de analisar, o modo como estes dois requisitos são inter-pretados que tem vindo a originar os principais problemas relativos ao seu registo. (CARVALHO, Maria Miguel, ««Novas» marcas e marcas não tradicionais: objeto», Direito Industrial, Vol. VI, Almedina, 2009, pág. 217-245).

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As marcas não tradicionais surgem assim num novo contexto comercial, onde proteger a denominação, as letras ou as figuras já não é suficiente para cativar a atenção do consumidor, onde as marcas tradicionais começam a esgotar-se (pela evidente finitude do abecedário e algarismos) e a necessidade de originalidade é crescente.

Tipologia de marcas não tradicionais

Embora os normativos nacionais e comunitários sejam meramente exemplificativos e estejam abertos a novas tipologias de marcas não tradicionais que, embora ainda numa fase embrionária, já começam a ser discutidas, designadamente as marcas táteis, gustativas dinâmicas e holográficas (SOUSA E SILVA, Pedro, Sinal e marca: as marcas não tradicionais, Direito Industrial, Vol. VIII, Almedina, 2012, pág. 363-381), vamos restringir o objeto da nossa análise às quatro tipologias reconhecidas de marcas não tradicionais: são elas as marcas sonoras, as marcas olfativas, as marcas tridimensionais e as marcas monocolores.

As marcas sonoras, como o nome indica, são constituídas apenas por sons ou melodias. Nada obsta ao registo deste tipo de marcas desde que possam ser «objeto de representação gráfica, através de figuras, linhas ou caracteres, que seja clara, precisa, completa por si própria, facilmente acessível, inteligível, duradoura e objetiva» (cfr. Acórdão do Tribunal de Justiça das Comunidades («TJCE») no Processo C-283/01, de 27 de Novembro de 2003). A representação destas marcas, considerou o TJCE, corporiza-se através de uma pauta musical, com compasso, figuras musicais e ritmos.

Em Portugal não se conhece mais do que um regis-to de marca sonora. Trata-se do registo da Marca Nacional n.º 480.308, registada a favor da Seguro Directo Gere - Companhia de Seguros, S.A. para serviços relacionados com seguros. Esta marca sonora consiste numa representação gráfica do jingle daquela companhia de seguros (mais conhecida como OK Teleseguros).

Quanto às marcas olfativas, as mesmas destinam-se a assinalar um odor exalado por um produto ou associado à prestação de um qualquer serviço que pode ser usado como sinal distintivo desse mesmo produto ou serviço (SOUSA E SILVA, Pedro, Sinal e marca: as marcas não tradicionais, Direito Industrial, Vol. VIII, Almedina, 2012, pág. 363-381).

Ao contrário das marcas sonoras, este tipo de marcas enfrenta desde logo uma dificuldade elevada de representação gráfica, bem como de tipificação do seu aspeto exterior. E esta vicissitude foi logo identificada numa decisão...

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