O regime das autorizaçoes ambientais no Brasil: Breves notas sobre a novel regulamentaçao

AutorLeonardo Luiz Selbach
CargoUniversidade do Vale do Itajaí / Universidad de Alicante
Páginas1-16

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I Do regime das autorizações ambientais no brasil
1. Notas Introdutórias

O direito brasileiro pode-se dizer verdadeiramente positivado, pois tem sofrido ao longo dos anos uma verdadeira enxurrada legislativa, ao ponto do presidente do Senado José Sarney1aduzir que "há no Brasil é um excesso de legislação. Temos aqui milhares e milhares de leis que tornam tudo quase impossível. E aí gosto de citar Montesquieu, que dizia que muitas leis, nenhuma lei. É o que acontece um pouco no Brasil, argumentou".

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Devido a grande gama de legislação o direito brasileiro está se tornando complexo e o estudo das competências está ganhando cada vez mais importância, competência esta que no âmbito de direito ambiental, de acordo com José Afonso da Silva2, pode ser conceituada como "as diversas modalidades de poder que se servem os órgãos ou entidades estatais para realizar suas funções, suas tarefas, prestar serviços".

Note-se que a organização do Estado Brasileiro também é intricada, mas para fins do Direito Ambiental Brasileiro material a Carta Magna os referiu e os disciplinou no art. 23:

"É competência comum da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios:

(...)

III - proteger os documentos, as obras e outros bens de valor histórico, artístico e cultural, os monumentos, as paisagens naturais notáveis e os sítios arqueológicos;

VI - proteger o meio ambiente e combater a poluição em qualquer das formas;

VII - preservar as florestas, fauna e flora;

(...)

Parágrafo único. Leis complementares fixarão normas para a cooperação entre a União e os Estados, o Distrito Federal e os Municípios, tendo em vista o equilíbrio do desenvolvimento e do bem-estar em âmbito nacional [Redação dada pela Emenda Constitucional nº 53, de 2006]".

Trata-se, in casu, de uma competência material comum da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios, e diz respeito à prestação dos serviços referentes às matérias de alguns incisos do art. 23 da CF que trazem à baila à proteção do meio ambiente cultural ou natural, à tomada de providências para a sua realização, por exemplo.

O art. 23, em seu parágrafo único, da Constituição Federal afirma que haverá lei complementar disciplinando a cooperação entre os entres federados regulamentando a competência material comum, ou seja, aquela que permite aos entes fiscalizar, implementar e licenciar questões ambientais.

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Obtempera-se que a inovação legislativa do poder constituinte derivado ocorreu em 2006 e somente em 2011 entra em vigor a novel Lei Complementar n. 140 de 08 de dezembro de 2011, com o fito de fixar normas para a cooperação entre os entes federativos, conforme dispõe seu artigo 1º:

"Esta Lei Complementar fixa normas, nos termos dos incisos III, VI e VII do caput e do parágrafo único do art. 23 da Constituição Federal, para a cooperação entre a União, os Estados, o Distrito Federal e os Municípios nas ações administrativas decorrentes do exercício da competência comum relativas à proteção das paisagens naturais notáveis, à proteção do meio ambiente, ao combate à poluição em qualquer de suas formas e à preservação das florestas, da fauna e da flora".

Poder-se-ia, equivocadamente, afirmar, então, que somente em 2011 houve a regulamentação da competência comum ambiental e a cooperação dos entes federativos nas questões ambientais.

Ocorre que a proteção ambiental já estava sendo garantida pela lei 6.938/81, que trata da

Política Nacional do Meio Ambiente, que prevê, ainda, no seu art. 8º:

"Compete3ao CONAMA4:

I - estabelecer, mediante proposta do IBAMA5, normas e critérios para o licenciamento de atividades efetiva ou potencialmente poluídoras, a ser concedido pelos Estados e supervisionado pelo IBAMA"6.

A norma paradigmática a que este artigo se refere é a Resolução nº 237/97 do Conselho Nacional do Meio Ambiente (CONAMA)7. Vê-se, então, que já havia uma sistemática regulamentar ambiental, em que o operador jurídico deveria se imiscuir no sistema protetivo ambiental, conhecendo as resoluções do CONAMA, inclusive.

Cite-se, por oportuno, o art. 1º, I, da referida Resolução que conceitua:

"Licenciamento Ambiental: procedimento administrativo pelo qual o órgão ambiental competente licencia a localização, instalação, ampliação e a operação de

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empreendimentos e atividades utilizadoras de recursos ambientais, consideradas efetiva ou potencialmente poluidoras ou daquelas que, sob qualquer forma, possam causar degradação ambiental, considerando as disposições legais e regulamentares e as normas técnicas aplicáveis ao caso".

Transcreve-se, para comparação, o art. 2º, I, da Lei Complementar n. 140/2011:

"licenciamento ambiental: o procedimento administrativo destinado a licenciar atividades ou empreendimentos utilizadores de recursos ambientais, efetiva ou potencialmente poluidores ou capazes, sob qualquer forma, de causar degradação ambiental".

A ulterior norma trouxe conceito mais generalizante, mas com contornos similares, isto é, não houve modificação substancial, nem superou a celeuma do termo licenciamento ambiental não traduzir a expressão jurídica licença, com o devido rigor técnico8, empregando-a de forma promiscua9.

Não se está dizendo que o termo licenciamento ambiental esteja de todo equivocado, mas sim que está empregado de forma não técnica e ampla para os diversos casos, que se dá a falsa ideia de que ela possa ser entendida como uma licença de Direito Administrativo10.

Licença para o Direito Administrativo, seguindo o entendimento de Dirley da Cunha Júnior11:

"É ato administrativo unilateral, vinculado e definitivo através do qual a Administração Pública reconhece, em benefício do administrado, um direito relativamente ao exercício de uma atividade jurídica (ex.: atividade profissional dependente de licença da OAB, CREMEB, CREA, ETC) ou material (ex.: licença para construir, de localização e funcionamento, etc)".

De outra banda, a autorização12é:

"(...) ato precário e discricionário, porque não pressupõe um direito anterior a ser exercido. Vale dizer, o direito ao exercício da atividade autorizada nasce com a

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outorga da autorização. Ao contrário, ela pressupõe uma proibição geral, expressa ou decorrente do sistema, ao exercício da atividade. Sua outorga consiste, assim, em remover esse obstáculo em favor de alguém, por razões de conveniência ou de mera liberalidade da Administração".

Podendo-se, então, aduzir que quando a Lei 6.938/81, a Lei Complementar 140/2011 e o art. 225, caput, da Constituição Federal citam o termo licenciamento este deve ser entendido como sinônimo de autorização13, motivo pelo qual estamos tratando do regime das autorizações ambientais, mas fazemos referência a licença e licenciamento ambiental.

2. Do Instrumento da Política Nacional do Meio Ambiente

Relevante apontar que as autorizações ambientais é um dos instrumentos da política nacional do meio ambiente do Brasil, constantes no art. 9º, da Lei 6.938/81, ao lado do zoneamento ambiental, do sistema nacional de informações sobre o meio ambiente e de instrumentos econômicos, como concessão florestal, servidão ambiental, seguro ambiental e outros.

As referidas autorizações são a manifestação do controle administrativo preventivo ambiental, decorrente do poder de polícia do Estado, sendo exigível, em regra14, das obras e atividades potencialmente causadoras de significativa degradação do meio ambiente, por expressa disposição constitucional, prevista no art. 225, §1º, IV, verbis: "exigir, na forma da lei, para instalação de obra ou atividade potencialmente causadora de significativa degradação do meio ambiente, estudo prévio de impacto ambiental15, a que se dará publicidade".

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Note-se que a exigência é constitucional não podendo os Estados-membros desobrigarem determinadas obras ou atividades, in abstrato, nem mesmo por previsão constitucional Estadual. O fato, em questão, já foi objeto de análise pelo Supremo Tribunal Federal, na Ação Direta de Inconstitucionalidade n. 1.086, Rel. Min. Ilmar Galvão, julgada em 07-06-2001:

"Ação direta de inconstitucionalidade. Art. 182, § 3º, da Constituição do Estado de Santa Catarina. Estudo de impacto ambiental. Contrariedade ao art. 225, § 1º, IV, da Carta da República. A norma impugnada, ao dispensar a elaboração de estudo prévio de impacto ambiental no caso de áreas de florestamento ou reflorestamento para fins empresariais, cria exceção incompatível com o disposto no mencionado inciso IV do § 1º do art. 225 da CF"16.

De se ver, então, que a outorga da licença, por vezes, é condicionada a realização de algum tipo de estudo ambiental, como o Relatório Ambiental, Plano e Projeto de Controle Ambiental, Relatório Ambiental Preliminar, Diagnóstico Ambiental, Plano de Manejo, Plano de Recuperação de Área17.

Transcreve-se, clarificando a aplicação desses estudos prévios, as palavras de Celso Antônio Pacheco Fiorillo18:

"Em que pese existir uma inevitável associação entre o estudo prévio de impacto ambiental e o meio ambiente natural, o EIA/RIMA não é um instrumento somente voltado a esse aspecto. Assim, é perfeitamente aplicável às demais «partições» do meio ambiente, a saber, meio ambiente artificial, cultural e do trabalho (...)".

Nota-se que os referidos estudos agem como "elemento de restrição da discricionariedade que ele mesmo criou, porquanto permite à Administração, como base nos elementos do estudo, a concessão ou não da licença" 19.

Havia até a edição da Lei Complementar n. 140/2011 o entendimento assente na doutrina de que a Resolução n. 237/97 do Conselho Nacional do Meio Ambiente (CONAMA) trazia, no seu anexo n. 1, rol de empreendimentos e atividades que estariam sujeitas ao licenciamento ambiental, sendo que...

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