O novo regime de intervenção corretiva, administração provisória, resolução e liquidação de instituições de crédito

AutorInês Caria Pinto Basto - Mafalda Almeida Carvalho
CargoAbogadas del Área de Derecho Mercantil de Uría Menéndez (Lisboa).
Páginas99-104

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Introdução

O Decreto-Lei n.º 31-A/2012, de 10 de fevereiro («DL 31-A/2012») opera uma revisão profunda do regime de saneamento e liquidação de instituições de crédito constante do Regime Geral das Instituições de Crédito e Sociedades Financeiras (aprovado pelo Decreto-Lei n.º 298/92, de 31 de Dezembro de 2012, «RGICSF»), introduzindo uma nova abordagem de intervenção do Banco de Portugal («BP»), caracterizada por três fases de intervenção: intervenção corretiva, administração provisória e resolução.

De acordo com os artigos 139.º e 140.º do RGICSF, os pressupostos de aplicação destas três fases de intervenção dependem (a) da gravidade do risco ou grau de incumprimento, por parte de uma instituição de crédito, das regras legais e regulamentares que disciplinam a sua atividade, bem como (b) da dimensão das respetivas consequências nos interesse dos depositantes ou na estabilidade do sistema financeiro.

Dentro destas balizas de atuação e sem qualquer relação de precedência, o BP, pautado pelos princípios gerais de adequação e proporcionalidade, pode adotar ou combinar as medidas estabelecidas em cada fase de intervenção, ainda que de natureza diferente.

(i) O anterior regime de saneamento e liquidação

O anterior regime de saneamento e liquidação das instituições de crédito encontrava-se regulado e condensado nos artigos 139.º a 153.º do «Título VIII Saneamento» do RGICSF, prevendo em traços gerais (a) um dever de comunicação ao BP, por parte do órgão de administração ou de fiscalização, caso a instituição de crédito se encontrasse «impossibilitada de cumprir as suas obrigações ou em risco de o ficar» e

(b) um conjunto de providências extraordinárias de saneamento que podiam ser adotadas pelo BP, caso uma instituição de crédito se encontrasse numa «situação de desequilíbrio financeiro, traduzido, designadamente, na redução dos fundos próprios a um nível inferior ao mínimo legal ou na inobservância dos rácios de solvabilidade ou de liquidez». Estas medidas incluíam a apresentação de um plano de recuperação e saneamento e a aplicação de determinadas restrições, nomeadamente a certos tipos de atividade, à concessão de determinado crédito ou a determinadas aplicações de fundos, bem como a limitação de dividendos e sujeição de certas operações ou atos à aprovação prévia do BP. Por outro lado, podia ainda o BP, em determinadas situações, designar administradores provisórios, designar uma comissão de fiscalização ou determinar a dispensa temporária de acatamento de certas normas prudenciais e de cumprimento pontual de obrigações.

As supra referidas providências extraordinárias deveriam apenas subsistir enquanto se verificasse a situação que as havia determinado. Verificando-se que as mesmas não permitiam recuperar a instituição, o anterior regime estabelecia a revogação da autorização da instituição considerada pelo BP, seguindo-se a sua liquidação.

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(ii) Génese da reforma

A crise financeira internacional e os seus efeitos no setor bancário suscitaram uma profunda reflexão internacional sobre as insuficiências dos mecanismos jurídicos e dos poderes de intervenção dos supervisores sobre instituições de crédito em potencial ou efetivo desequilíbrio financeiro. Desta reflexão resultou, desde logo, evidenciando a necessidade de implementação de mecanismos capazes de permitir a recuperação de uma instituição de crédito ou a sua liquidação ordenada, de modo a salvaguardar o interesse da estabilidade financeira, o risco de contágio sistémico e a proteção dos depositantes.

Refira-se que o DL 31-A/2012 surge na sequência do Memorando de Entendimento sobre as Condicionalidades de Política Económica, relativo à concessão de assistência financeira a Portugal, no qual se previu expressamente a reforma do regime de saneamento e liquidação de instituições de crédito regime.

Com efeito, a publicação deste diploma foi precedida de várias iniciativas europeias de reforma do setor bancário, das quais importa salientar, pela influência que tiveram na preparação daquele diploma, bem como pela sua utilidade na interpretação de alguns dos seus artigos, o estudo intitulado Technical details of a possible EU framework for bank recovery and resolution, publicado pela Comissão Europeia («CE») em Janeiro de 2011, bem como o documento Key attributes of effective resolution regimes for financial institutions, publicado pelo Financial Stability Board em outubro de 2011. Tais estudos viriam a conduzir à apresentação pela CE, no passado dia 6 de junho de 2012, de uma proposta de Diretiva, a qual se encontra em discussão, prevendo um novo enquadramento para a recuperação e resolução de instituições de crédito e empresas de investimento.

(iii) Princípios orientadores

Este novo regime visa, na sua essência: (a) a prevenção, através do incremento dos poderes de supervisão do BP, traduzido em deveres de reporte de informação adicionais e sobretudo mais objetivos, de elaboração periódica de planos de contingência, de identificação e controlo do risco e de antecipação de medidas de resolução adequadas; (b) uma inter-venção precoce, através da introdução de medidas de intervenção corretiva, de molde a permitir aos bancos a manutenção da sua atividade; e (c) a introdução de medidas de resolução administrativas ou extra-judiciais e de instrumentos de reestruturação ou dissolução controlada (tais como a alienação de ativos ou a transferência parcial ou total da ativida- de para bancos de transição) de modo a assegurar depósitos e outros serviços essenciais, bem como a estabilidade do sistema financeiro.

Medidas preventivas e de intervenção precoce

Prevê-se, no artigo 116.º-D do RGICSF, um novo dever de reporte aplicável às...

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