Meio de tutela de direitos de propriedade intelectual: a directiva do "enforcement"

AutorIsabel Sarsfield Rodrigues
CargoAdvogada da Área de Contencioso de Uría Menéndez (Lisboa)
Páginas105-109

    Isabel Sarsfield Rodrigues.Advogada da Área de Contencioso de Uría Menéndez (Lisboa).

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Introdução

Com o presente artigo pretende-se dar a conhecer a Directiva 2004/48/CE do Parlamento Europeu e do Conselho de 29 de Abril de 2004 relativa ao respeito dos direitos de propriedade intelectual, vulgar- mente denominada "Directiva do Enforcement", e reflectir sobre alguns aspectos concretos que se revelam inovadores face ao actual ordenamento jurídico português. Infelizmente, a Directiva ainda não foi transposta para a ordem jurídica portuguesa apesar de o prazo previsto para o efeito ter já terminado em 29 de Abril de 2006.

O direito da propriedade intelectual tem assumido, nos últimos anos, uma notoriedade, importância prática e especificidade que justificam um tratamento autónomo dos seus aspectos processuais, que são precisamente aqueles sobre as quais a Directiva versa.

A Directiva aplica-se a toda a propriedade intelectual no seu sentido mais lato, abrongendo quer a propriedade industrial, quer os direitos de autor e cone- xos, quer mesmo um conjunto de "novos" direitos que têm vindo a ser criados (ou autonomizados) nas ordens jurídicas dos diversos Estados Membros.

Após a esforço de harmonização legislativa que perpassou transversalmente todas as áreas da denominada propriedade intelectual, entendeu o legislador comunitário que era chegado o momento de uniformizar as disposições legais que visam a protecção efectiva dos direitos entretanto já consagrados e respectivos titulares. Trata-se, pois, de implementar um conjunto de normas (maioritária mas não exclusivamente, adjectivas e procedimentais) com vista a garantir uma protecção idêntica em toda a União Europeia daqueles mesmo direitos já instituídos.

A protecção da propriedade intelectual é determinante para a promoção da inovação e da criação e, bem assim, para o desenvolvimento do emprego e o reforço da competitividade, devendo, também, permitir que o inventor ou criador aufiram os proveitos legítimos em resultado do investimento humano, técnico, criativo e financeiro na sua invenção ou criação, sob pena de estos serem desencorajadas e os investimentos reduzidos.

Constatou-se que existem -nos Estados Membros- disparidades em relação aos meios destinados ao respeito pelos direitos de propriedade intelectual que são também prejudiciais ao bom funcionamento do mercado interno e conduzem ao enfraquecimento do direito material da propriedade intelectual.

Em face de todas estas evidências, a presente Directiva tem como objectivo aproximar as legislações nacionais, assegurando -por esta via- um elevado nível de protecção da propriedade intelectual. Este é um importante dado a reter e que perpassa todo o dispositivo da Directiva: o legislador comunitário pretendeu, na sua tarefa de harmonização legislativa "nivelar por cima" (isto é por um nível elevado de protecção) os direitos de propriedade intelectual, reconhecendo expressamente um conjunto de especificidades que decorrem não só da sua específica natureza como também da sua particular violabilidade.

Importa, pois, analisar alguns aspectos concretos da Directiva em relação aos quais será curioso conhecer a futura transposição pelo legislador nacional e a sua conjugação com os regimes legais já existentes. A relevância deste tema prende-se com o especial cuidado que o legislador português deverá ter na forma de transposição, já que se trata de uma oportunidade única para melhorar o estado actual da protecção da propriedade intelectual. A título de exemplo refira-se que, entre 2000 e 2005, o valor do mercado fonográfico caiu 50%, em grande parte devido à "pirataria" e em particular à generalização e proliferação das redes de "peer-to-peer". É urgente travar esta evolução! Os meios actualmente existentes são parcos e há uma fraca consciência social das ilicitudes, mesmo pelos próprios Tribunais. São especialmente gravosas as dificuldades na produção da prova potenciada pela morosidade da justiça e os reduzidos valores indemnizatórios arbitrados pelos Tribunais, que demovem os titulares de direitos de agir judicialmente, com o que se promove a imagem de relativa impunidade das infracções. Por tudo isto, a Directiva do Enforcement é considerada, por Page 106muito operadores, como uma oportunidade de ouro para inverter a situação actual.

Aspectos concretos da Directiva do Enforcement

Optou-se por analisar apenas alguns dos preceitos da Directiva, sugerindo-se -em alguns casos- eventuais vias para a sua transposição.

Desde logo, o artigo 3.º da Directiva prevê a obrigação de os Estados Membros assegurarem o respeito pelos Direitos da Propriedade Intelectual com procedimentos e recursos justos, equitativos, não desnecessariamente onerosos, com prazos razoáveis e, simultaneamente, eficazes, proporcionais e dissuasivos de violações. Trata-se de princípios orientadores que, certamente, serão de difícil respeito pelo Estado Português atento o estado actual da justiça e o congestionamento dos Tribunais. Para facilitar o cumprimento destes princípios -viabilizando a distribuição dos procedimentos por várias comarcas-, sugere-se a atribuição de competência territorial quer aos Tribunais do domicílio ou sede do titular do direito ou do seu legítimo representante, quer do domicílio ou sede do presumível...

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