O âmbito de aplicação temporal do artigo 501.º do Código das Sociedades Comerciais: cessação da responsabilidade com a extinção da relação de grupo?

AutorFrancisco da Cunha Ferreira - Duarte Garin
CargoAbogados del Área de DIUM y de Derecho Mercantil de Uría Menéndez-Proença de Carvalho (Lisboa).
Páginas112-116

Page 112

Introdução

O artigo 501.º do Código das Sociedades Comer-ciais («CSC») estabelece um regime especial de responsabilidade por dívidas de acordo com o qual, em determinadas circunstâncias, uma sociedade diretora ou dominante pode ser responsável pelas obrigações de uma subsidiária - sociedade subordinada ou dependente - quando tais obrigações tenham sido constituídas antes ou na vigência dessa relação de grupo. Para maior facilidade referimo-nos à sociedade diretora ou dominante como «sociedade-mãe» e à sociedade subordinada ou dependente como «sociedade-filha».

Neste artigo pretendemos responder à seguinte questão: a responsabilidade prevista no artigo 501.º do CSC mantém-se após o termo da relação de grupo entre a sociedade-mãe e a sociedade-filha? Ou, pelo contrário, a responsabilidade cessa com a extinção dessa relação de grupo?

O tema era relativamente pacífico na doutrina e na jurisprudência em Portugal, fazendo escola a tese segundo a qual a responsabilidade ao abrigo do artigo 501.º do CSC se mantém, não obstante a extinção da relação de grupo. Contudo, doutrina recente veio defender a tese contrária, abrindo uma discussão sobre o âmbito de aplicação temporal do artigo 501.º do CSC.

Esta análise iniciar-se-á com uma breve análise do regime consagrado no artigo 501.º do CSC e das principais características desta responsabilidade. Seguidamente analisaremos a doutrina e a jurisprudência que se têm pronunciado sobre o tema do âmbito de aplicação temporal do artigo 501.º do CSC, concluindo com uma análise crítica às teses em confronto.

Artigo 501º do CSC: inserção sistemática

O artigo 501.º do CSC está sistematicamente inserido no Título VI (Sociedades Coligadas) do CSC no capítulo dedicado ao regime jurídico das sociedades em relação de grupo (Capítulo III) e, dentro deste capítulo, na secção referente ao contrato de subordinação (Secção III).

A regulação das relações que se estabelecem entre sociedades coligadas previsto no Título VI do CSC não tem praticamente paralelo noutros ordenamentos jurídicos europeus (vide CORDEIRO, António Menezes, A responsabilidade da sociedade com domínio total (501.º/1, do CSC) e o seu âmbito, Revista de Direito das Sociedades, ano III, número 1, Almedina, 2011, pág. 100-101): resulta da incorporação no direito português de uma proposta de Diretiva Comunitária (9.ª Directiva) que nunca chegou a ser aprovada.

Estão sujeitas ao regime estabelecido no Título VI do CSC as relações que entre si estabeleçam sociedades por quotas, sociedades anónimas e sociedades em comandita por ações e que tenham a sua sede em Portugal (com exceção das situações referidas no artigo 481.º, número 2 do CSC))

A lei qualifica três situações de sociedades em relação de grupo:

(i) Grupos constituídos por domínio total: quando uma sociedade - dita dominante - detém a totalidade das ações representativas do

Page 113

capital social de uma outra sociedade - dominada - podendo essa relação de domínio total ser inicial ou superveniente (cfr. artigos 488.º e 489.º do CSC);

(ii) Contrato de grupo paritário: quando duas ou mais sociedade que não sejam dependentes nem entre si nem de outras sociedades, constituem um grupo, mediante contrato pelo qual aceitam submeter-se a uma direção unitária e comum (cfr. artigo 492.º do CSC); e

(iii) Contrato de subordinação: quando uma sociedade - dita subordinada - aceita, por contrato, subordinar a gestão da sua própria atividade à direção de uma outra sociedade, quer seja sua dominante, quer não (cfr. artigo 493.º do CSC).

De entre estas três situações que configuram uma relação de grupo, o artigo 501.º do CSC está sistematicamente inserido na regulação das sociedades submetidas a um contrato de subordinação.

Dispõe o artigo 501.º do CSC (cuja epígrafe é «Responsabilidade para com os credores da sociedade subordinada»):

1. A sociedade diretora é responsável pelas obrigações da sociedade subordinada, constituídas antes ou depois da celebração do contrato de subordinação, até ao termo deste.

2. A responsabilidade da sociedade diretora não pode ser exigida antes de decorridos 30 dias sobre a constituição em mora da sociedade subordinada.

3. Não pode mover-se execução contra a sociedade diretora com base em título exequível contra a sociedade subordinada.

Para além da sua aplicação (direta) às sociedades submetidas a um contrato de subordinação, o regime estabelecido no artigo 501.º do CSC (e também nos artigos 502.º a 504.º do CSC) é aplicável às sociedades em relação de grupo por domínio total (inicial ou superveniente) - i.e., à sociedade dominante e à sociedade dependente - por força da norma remissiva constante do artigo 491.º do CSC.

Artigo 501º do CSC: fundamento para a sua consagração legal

O regime de responsabilidade previsto no...

Para continuar leyendo

Solicita tu prueba

VLEX utiliza cookies de inicio de sesión para aportarte una mejor experiencia de navegación. Si haces click en 'Aceptar' o continúas navegando por esta web consideramos que aceptas nuestra política de cookies. ACEPTAR