Heróis ou robots? desafios à cidadania na sociedade da informação. Para uma Teorização Histórico-Constitucional Prospetiva

AutorPaulo Ferreira da Cunha
CargoFaculdade de Direito da Universidade do Porto
Páginas347-362
HERÓIS OU ROBOTS?
DESAFIOS À CIDADANIA
NA SOCIEDADE DA INFORMAÇÃO.
Para uma Teorização Histórico-Constitucional
Prospetiva1
HEROES OR ROBOTS?
CHALLENGES TO CITIZENSHIP
IN THE INFORMATION SOCIETY.
Elements for an Historical-Constitutional Prospective
Theorization
Paulo Ferreira da Cunha
Faculdade de Direito da Universidade do Porto
Sumário: I. CONCEITOS E PRECONCEITOS JUSPOLÍTICOS NA SOCIEDADE
INFORMACIONAL. II.QUESTÕES CONSTITUCIONAIS, CONCEITUAIS E
HISTÓRICAS: 2.1.Chefes, heróis, salvadores: substitutos da Cidadania. 2.2. O
Constitucional. 2.3. Os Chefes. 2.4. Políticos e Estadistas. III.TEMPOS E TEMAS:
3.1. Delimitação Temporal. 3.2. Delimitação do objeto. 3.3. Antiheróis? 3.4.Carisma
e Irracionalidade na Sociedade da Informação.
Resumo: Parece haver hodiernamente alguma esquizofrenia jurídica e política. Se
por um lado se apregoa o Estado Constitucional, Estado de Direito, democrático,
social, cultural, etc., por outro se diz que estamos numa sociedade de
informação, como sinónimo da própria contemporaneidade, e não pouco
autorizadas vozes a identificam com menos democracia e de algum modo um
exílio ou subalternização da Constituição, que parece até supérflua, ante o poder
magnífico da técnica. Nestas circunstâncias contraditórias, que pluralismo é
possível, e que lideranças serão engendradas?
Abstract: It seems to be in our times some legal and political schizophrenia. On
the one hand is proclaimed the constitutional state, the rule of law, democratic,
social, cultural state, etc., on the other it is said that we are in an information
society, as synonymous of the contemporary, and some authoritative voices
identify that paradigm with less democracy and somehow exile or subordination
of the Constitution, which seems even superfluous before the magnificent
technical power. Under these contradictory circumstances, is pluralism still is
possible, and what kind of leaders will be engendered?
1 Poderão notar-se em alguns passos deste artigo intertextualidades com outros textos do
autor. Contudo ele tem, no seu conjunto, vida própria, especialmente por uma focalização na
sociedade da informação e nos perigos fundamentalistas, seus paradoxais mas reais
contemporâneos. Além disso, é natural que seja refundido e reutilizado em livro do autor, numa e
noutra das margens do Atlântico.
Revista de Historia Constitucional
ISSN 1576-4729, n.18, 2017. http://www.historiaconstitucional.com, págs. 347-362
Palavras-Chave: História Constitucional, Chefe, Estado Constitucional,
Liderança, Pluralismo, Sociedade da Informação
Key words: Constitutional history, Chief, Constitutional State, Leadership,
Pluralism, Information Society.
“(…) não havendo mais autoridade e não havendo
mais decisões a tomar, que sentido terá na sociedade
telemática emergente falar-se em governo, em poder, já
que tal sociedade será dominada pela imagem? Qual será
a estrutura político-administrativa de tal sociedade?” .
Vilém Flusser
I. CONCEITOS E PRECONCEITOS JUSPOLÍTICOS NA SOCIEDADE
INFORMACIONAL
alguns desafios hodiernos a ter muito em conta na história
constitucional hodierna, que ao mesmo tempo possuem e não possuem
precedentes na História Constitucional (e política) passada. Os desafios são de
índole ideológica e tecnológica. E da sua tensão e conjunção não poucos
problemas surgem.
Não é verdade que a tecnologia ou a panótica informação e a informatização
sejam avessas à ideologia. Isso foram fumos (eles mesmos não alheios à ideologia)
de um tempo não distante, mas superado e que hoje já não conseguem iludir:
estão patentes as clivagens ideológicas: everything old is new again 2. Pelo
contrário, evidentemente e com uma enorme força (desde logo de discurso
legitimador e fonte de ilusão), uma ideologia tecnocrática, de muito
identificada, e quanto mais as técnicas se vão expandindo e, associadas ao
consumismo, podem ser Ersatz de revolução ou de descontentamento, mais água
vai sendo levada ao moinho da ideologia tecnocrática. Hoje, informacional,
prevalentemente.
A própria expressão, hoje já um tanto em desuso, de demotecnocracia era
um híbrido que correspondia a um discurso legitimador 3 de um pretenso
eficientismo, ou “meritocracia” que em grande medida procura fórmulas muito
mitigadas ou musculadas de verdadeira representatividade e pluralismo.
A informação e mega poder informático também engendram as suas
equivalências ideológicas, ao ponto de profundas transformações na política
2 Sobre ideologia, válido para as grandes linhas, mas apesar de tudo já algo desatualizado no
detalhe, Paulo Ferreira da Cunha, Repensar a Política. Ciência & Ideologia, 2.ª ed., Coimbra,
Almedina, 2007.
3 Sobre este conceito, clássico é o livro de João Baptista Machado, Intro dução ao Direito e ao
Discurso Legitimador, reimp., Coimbra, Almedina, 1985.
Paulo Ferreira da Cunha
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