Competência do Ministério Público Estadual nas ações ambientais minerárias

AutorGabriel Melo Viana
Introdução

O Direito Ambiental e o conceito de meio ambiente ocupam posição estratégica na atualidade, tendo em vista a crescente conscientização da população acerca dos grandes prejuízos causados à sociedade pela destruição do meio ambiente. Estes prejuízos se intensificam com o desenvolvimento econômico, já que os recursos naturais são explorados e/ou destruídos em prol do capital. Neste cenário, a mineração é uma das principais atividades econômicas da atualidade e uma das que mais polui e destrói o meio ambiente, tendo em vista que a exploração mineral exige grandes interferências no sistema ecológico, alterando a qualidade do ar, do solo, das águas e das comunidades que vivem na região.

Com o constante combate aos danos ambientais, determinados órgãos são obrigados a intervir, pois, em muitos casos, o poder público e os entes administrativos são omissos e, em algumas vezes, até coniventes com atividades intensamente poluidoras. E um destes órgãos intervenientes é o Ministério Público que possui, como função institucional, a tarefa de cuidar do meio ambiente. Porém, há uma intensa discussão relativa à competência para atuar em questões ambientais ligadas à atividade minerária, já que a Constituição prevê à União a titularidade do bem mineral e igualmente prevê a competência legislativa privativa para a mesma. Há, por alguns, a defesa da ideia de que por estes fatores só incumbe ao Ministério Público Federal a importante tarefa de participar de ações ambientais minerárias. O que ocorre é que a própria Constituição prevê que a competência para tratar do meio ambiente é de todos os entes federados. Logo, nesta ótica, compete ao Ministério Público Estadual também atuar em questões ambientais. Mas, surge o dilema sobre a possibilidade de uma competência afastar a outra.

Então, há um debate sobre qual o Ministério Público legítimo e competente para atuar em questões ambientais minerárias. Dilema que não pode haver, pois a discussão em questão é a tutela do meio ambiente e conflitos entre os Parquet podem, inclusive, vir a atrasar processos judiciais, postergando a responsabilização daqueles que estão danificando o meio ambiente.

A degradação do meio ambiente não para, é constante e não respeita prazos processuais e nem, muito menos, discussões entre órgãos que deveriam estar trabalhando efetivamente juntos para o combate à destruição de qualquer forma.

Diante de tal panorama, o presente estudo vem discutir de quem é a competência para agir no caso de questões ambientais relacionadas à mineração e com o intuito de contribuir para uma maior efetividade na proteção ao meio ambiente.

Dano e responsabilidade

No Direito Ambiental, a responsabilidade por dano é objetiva bastando a existência do dano e do nexo de causalidade. Para comprovar a presença do nexo, basta a comprovação da existência de fato potencialmente causador do dano.

Para eximir a sua responsabilidade, o suposto poluidor tem a obrigação de provar que a lesão ao meio ambiente não foi fruto de sua atividade.

Os danos ambientais possuem características peculiares como a constitucionalidade da tutela ambiental e a necessidade, por conta dos princípios jus-ambientais da prevenção e precaução, de proteger o meio ambiente e evitar, assim, que haja danos que podem vir a ser irreparáveis, como é de praxe em matéria ambiental.

O dano, em matéria ambiental, é responsabilizável criminalmente, civilmente e administrativamente.

Há a possibilidade de não conseguir ser determinada a autoria do dano ambiental, como pode ocorrer em distritos industriais ou zonas onde coexistem vários agentes poluidores. Neste caso a solução, em regra, adotada é a da responsabilidade solidária, com fulcro no art. 942 do Código Civil.

Para haver a responsabilidade pelo dano, o dano necessita ser significativo o suficiente para alterar de maneira relevante o meio ambiente. A valoração de indenização e apuração do dano ambiental é complexa, pois o dano ambiental puro é inestimável.

Mineração

A mineração ocupa um papel importante no contexto mundial, sendo que no Brasil, a mineração exerce o papel de um dos principais protagonistas econômicos em muitos estados. O desenvolvimento da mineração muitas vezes, para não dizer sempre, gera conflitos com o meio ambiente.

Os impactos causados pela atividade minerária são inúmeros e de grandes proporções. A mineração tem como uma de suas características intrínsecas o fato de ser uma atividade fortemente poluente. E decorrente disso, vem a preocupação em prevenir danos desnecessários e em restaurar áreas inevitavelmente degradadas pela mineração.

Entre os danos causados pela mineração pode-se enumerar: a contaminação de águas; poluição do ar; o desmatamento e a consequente destruição da flora local; a perturbação da fauna; a poluição sonora e a alteração do solo. Os danos podem, dependendo do tipo de exploração, ser de âmbito local ou regional.

Licenciamento ambiental

O procedimento adotado para evitar estes danos ambientais é o licenciamento ambiental, procedimento burocrático cujo qual toda atividade mineradora deve passar antes de ser iniciada, inclusive anteriormente a sua atividade de pesquisa.

O processo de licenciamento ambiental visa, também, minimizar eventuais problemas e condicionar o empreendimento a respeitar o conceito de responsabilidade social, já que o meio ambiente é patrimônio de todos. A Carta Magna estabelece que os recursos minerais, inclusive os do subsolo são propriedade da União. O Departamento Nacional de Produção Mineral - DNPM regula o setor de mineração, expedindo autorizações e fiscalizando a atividade mineradora.

O procedimento licenciatório para a atividade de mineração possui duas etapas que são a autorização de pesquisa e a concessão de lavra. A importância deste procedimento deriva de sua complexidade já que exige previamente a pesquisa para comprovar a existência da jazida mineral e logo após esta comprovação haver a concessão da lavra. Evitando danos ambientais desnecessários. Vale lembrar que apesar de poder ser utilizado para todas as substâncias minerais, é vedada sua utilização para substâncias minerais protegidas por monopólio que são petróleo, gás natural e material radioativo, como urânio.

Princípio da universalidade ambiental

A Constituição Federal (1988), no seu art. 225, dispõe que: "Todos têm direito ao meio ambiente ecologicamente equilibrado, bem de uso comum do povo e essencial à sadia qualidade de vida, impondo-se ao Poder Público e à coletividade o dever de defendê-lo e preservá- lo para as presentes e futuras gerações". Este dispositivo explicita o conceito universal do meio ambiente que é patrimônio de toda a humanidade, incluindo aqueles que ainda não nasceram. Por ser patrimônio de todos, pressupõe a responsabilidade coletiva por ele também. Todos têm o dever de preservar o meio ambiente e o risco de ser punido por danos causados. Além disso, existe o direito/dever de fiscalizar e defender, sendo imposto a todos, incluindo, obviamente, a figura essencial do Ministério Público.

Ministério público

O Ministério Público é instituição permanente, essencial à função jurisdicional do Estado, incumbindo-lhe a defesa da ordem jurídica, do regime democrático e dos interesses sociais e individuais indisponíveis, conforme texto constitucional (art. 127). É composto de promotores independentes e opera independentemente dos três poderes (judiciário legislativo e executivo). O Ministério Público, no Brasil, opera tanto a nível federal, quanto estadual, tendo o federal, atribuições relativas a matérias de competência da União e os estaduais, a matéria restante ou a matéria de competência estadual.

Ele é previsto na Carta Magna e regulamentado, conforme o parágrafo 5º do art. 128 da CF, por lei complementar, sendo esta a Lei Complementar nº 75/1993. Além desta Lei, a Instituição é regulamentada pela Lei Ordinária nº 8.625/93 e por leis orgânicas estaduais, estas regulamentando os Ministérios Públicos estaduais.

Em questão de meio ambiente, interessa o estudo mais aprofundado do Ministério Público Federal e dos estaduais, os quais têm atribuições em questões ambientais.

Conforme vemos na transcrição dos artigos 37, II da Lei Complementar 75, que é a Lei Orgânica do Ministério Público da União, organismo do qual o MPF faz parte:

"Art. 37. O Ministério Público Federal exercerá as suas funções:

I - nas causas de competência do Supremo Tribunal Federal, do Superior Tribunal de Justiça, dos Tribunais Regionais Federais e dos Juízes Federais, e dos Tribunais e Juízes Eleitorais;

II - nas causas de competência de quaisquer juízes e tribunais, para defesa de direitos e interesses dos índios e das populações indígenas, do meio ambiente, de bens e direitos de valor artístico, estético, histórico, turístico e paisagístico, integrantes do patrimônio nacional;"

Aos Ministérios Públicos Estaduais, entende-se possuir competência residual no que trata do inciso I deste artigo, ou seja, manifestar-se em causas de competência da Justiça Estadual.

E, no que tange ao inciso II, a competência é comum quando se trata da proteção ao meio ambiente, além do texto constitucional traz em seu art. 129, III a função institucional do Parquet (seja ele federal ou estadual) para "promover o inquérito civil e a ação civil pública, para a proteção do patrimônio público e social, do meio ambiente e de outros interesses difusos e coletivos", a competência do Ministério Público dos estados para essas questões está assegurada pelo art. 25, IV, alínea "a" da Lei 8.625/93 que dispõe normas gerais relativas aos MPE.

Ação civil pública

A Ação Civil Pública é um instrumento processual, regido pela Lei 7.347/85, que visa proteger interesses difusos e coletivos e pode ser ajuizada pelo Ministério Público, entre outros entes, que tem legitimidade, para este tipo de ação, prevista na Constituição, nos termos do art. 129, III que a define, inclusive, como uma de suas funções institucionais.

É previsto na Lei 7.347/85, no § 5. ° do art. 7° que "Admitir-se-á o litisconsórcio facultativo entre os Ministérios Públicos da União, do Distrito Federal e dos Estados na defesa dos interesses e direitos de que cuida esta lei". Deste modo, a proteção ao meio ambiente se caracteriza como forma concreta de litisconsórcio ativo dos Ministérios Públicos Estaduais e Federal já que a tutela ambiental é de competência de todos.

Logo, as ACP em questões ambientais possibilitam a participação de ambos os MP. Podendo o Federal e o Estadual atuar em conjunto ou separadamente. Legitimidade, neste caso, de um, não afasta a do outro. A competência é comum quando se trata da proteção ao meio ambiente.

Inquérito civil

Também previsto como função institucional do Ministério Público, o Inquérito Civil é um procedimento administrativo que possui a função de colher provas e evidências para posteriormente vir a instruir uma Ação Civil Pública ou, simplesmente, vir a mostrar a ausência de fundamentos para a ação.

Competência constitucional

Desde a Carta Magna de 1891, é previsto, no Brasil, o regime federativo, sendo, então, defeso à União a intervenção em assuntos de interesse estadual, conforme o texto do art. 6° da CF/1891 que dizia: "o Governo Federal não poderá intervir em negócios peculiares aos Estados". É intrínseco ao federalismo a independência dos entes federativos e a liberdade em fiscalizar e atuar em matérias de seu interesse, não possuindo lógica e ferindo o conceito de federalismo o entendimento contrário, salvo exceções, como reza o disposto.

A Carta Magna atual distribui competências para todos os entes. Sendo algumas reservadas como de interesse privativo e/ou legislativo da União, como, por exemplo, o que ocorre com a competência para tratar de minas e jazidas, tema do presente trabalho. Ocorre que a Constituição de 1988 prevê itens de competência privativa e de competência concorrente e muitos temas ultrapassam os limites de uma única competência, como é o caso da mineração que além de ser de competência legislativa privativa da União, alcança a competência concorrente relativa ao meio ambiente. Os limites de uma competência não são estáticos. Como diz o professor Paulo Affonso Leme Machado: "A dúvida na partilha da competência no sistema federativo, diferentemente do sistema unitário, deve levar à comunhão no exercício da competência e não à exclusividade da competência". Neste diapasão, prevalece a competência concorrente quando houver dúvidas, devendo haver a integração de competências a ponto de permitir a manutenção da eterna busca pelo bem comum. A competência não pode ser entregue somente a um ente de forma absoluta, impedindo que na ausência de interesse deste de tomar as medidas cabíveis, outro ente possa de forma suplementar, ajuizar a devida ação.

Não havendo interesse da União em propor ação, não se pode pensar em ignorar os potenciais danos ao meio ambiente. A Carta Magna prevê, no artigo 22, XII, que legislar sobre recursos minerais é de competência privativa da União. Destarte, vale ressaltar, a diferença entre competência exclusiva (aquela prevista pelo art. 21) e a competência privativa (artigo 22) que é a possibilidade de delegação desta. Diz o parágrafo único do art. 22, CF: "Lei complementar poderá autorizar os Estados a legislar sobre questões específicas das matérias relacionadas neste artigo". Apesar da necessidade de lei complementar para delegação da competência em questão de mineração, o art. 23, VI é claro em seu texto: "Art. 23 - É de competência comum da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios: [...] VI - proteger o meio ambiente e combater a poluição em qualquer de suas formas".

Ora, nota-se, então, que a competência privativa da União se refere simplesmente a legislar em questões de mineração, logo, o Ministério Público Estadual não pretende legislar ou tratar especificamente de mineração e sim proteger o meio ambiente e combater a poluição em qualquer de suas formas, como no texto do inciso VI do art. 23. Mineração se inclui em poluição em qualquer de suas formas. Não há de confundir o conceito de competência exclusiva com o conceito de competência para legislar privativamente.

O art. 24, §2º da Lei Maior, prevê que a competência da União para legislar sobre normas gerais não exclui a competência suplementar dos Estados, logo, com isso, percebe que a intenção do constituinte é colocar a União no papel de criar diretrizes e os outros entes no papel de executores quando se trata de matéria de competência concorrente, como é o caso da proteção ao meio ambiente, sendo então esta dever de todos os entes federativos.

De acordo com Vicente Gomes da Silva, "no que tange à competência material comum, verifica-se que o legislador constituinte delimitou uma área de competência que deve ser exercida conjuntamente, vale dizer, a União, Estados, Distrito Federal e Municípios deverão partilhar a responsabilidade pela gestão ambiental" (SILVA, 2006, p.31).

Sendo assim, o Ministério Público Estadual e o Ministério Público Federal, em face da gestão ambiental, podem ajuizar ações cabíveis em questões relativas a danos ambientais, incluindo nestes, o dano ambiental minerário.

Vale lembrar que ao Ministério Público Federal compete atuar em causas minerárias por duas razões. Primeiramente em face do recurso econômico mineral, bem da União, e também se tratando dos danos ambientais causados pela mineração. Ao Ministério Público Estadual é claramente permitida a atuação em questões ambientais, entendimento protegido e consolidado pela Carta Magna. Realizar a análise sob a ótica da competência judiciária é também fazê-la sob a ótica da competência dos MP, já que ao MPF é assegurada a atuação em causas de competência da Justiça Federal e aos MPE a para a atuação residual, ressalvada a possibilidade de atuação do Ministério Público Federal em ações de competência comum perante a Justiça Estadual, não anulando neste caso a competência do Parquet estadual.

Neste diapasão, o Tribunal Regional Federal da Primeira Região entendeu em seu acórdão transcrito abaixo que:

PENAL E PROCESSUAL PENAL. CRIMES CONTRA O MEIO AMBIENTE. EXTRAÇÃO DE AREIA. COMPETÊNCIA. JUSTIÇA FEDERAL E ESTADUAL. NECESSIDADE DE DEMONSTRAÇÃO DO INTERESSE ESPECÍFICO FEDERAL. NÃO CONFIGURAÇÃO IN CASU. INCOMPETÊNCIA DA JUSTIÇA FEDERAL. RECURSO EM SENTIDO ESTRITO NÃO PROVIDO.

1. A competência para processar e julgar crimes cometidos contra o meio ambiente não é exclusiva da Justiça Federal, em razão do interesse comum que a Constituição Federal atribui aos entes federados (artigos 23, VI e XI e 225).

2. Para fins definição da competência da Justiça Federal, a lesão a bens, interesses ou serviços da União ou de suas autarquias deve ser específica. Não é suficiente o interesse genérico.

3. O Código de Mineração institui diversos regimes de autorização para exploração das jazidas minerais, os quais podem ser outorgados, inclusive, por autoridades locais.

4. O aproveitamento da substância mineral areia pode ser feito sob o regime de Licenciamento, que cabe às autoridades locais (art. 8º, Decreto-Lei 227/67).

4. Recurso criminal não provido.

(DISTRITO FEDERAL, TRF - PRIMEIRA REGIÃO, RCCR 2066 TO 2001.43.00.002066-8, Rel. Des. Fed. Carlos Olavo).

Deste modo, destaque para a necessidade de interesse específico para afastar a competência do Judiciário Estadual em prol da Justiça Federal. Não basta, tão somente, ser também de competência da União, há de existir um legítimo interesse para atuar exclusivamente. É evidente o interesse comum dos entes federados para processar, julgar e, consequentemente, fiscalizar danos ambientais decorrentes da mineração.

O respeitável acórdão mostra com absoluta clareza que, apesar da Constituição atribuir competência federal para matérias de mineração, o que está em questão é a preservação do meio ambiente e, também, a atribuição da competência local para danos ambientais de alcance limitado, não tendo, no caso em voga, havido dano que enseje interesse federal.

Lei Complementar 140/2011

Apesar de a atual Constituição definir a União como titular do bem mineral, para o exercício da atividade licenciatória o que define a fixação de competência não é a titularidade do bem e sim o grau de impacto ambiental proporcionado pela atividade minerária, conforme se pode notar na Lei Complementar 140/2011 que estabelece a competência municipal para o licenciamento de empreendimentos de impacto local, grau de impacto este definido por resolução do respectivo Conselho Estadual.

Com fulcro no art. 1º da lei, houve a intenção de criar um liame cooperativo entre as esferas federativas no país, evitando uma concentração exacerbada de competências para a União. A União não tem estrutura, seja administrativa ou política, para fiscalizar e dar a devida atenção a todo o território nacional, tornando o licenciamento de qualquer atividade, até então, um caminho penoso para o empresário, com efeitos negativos na própria atividade econômica nacional. O licenciamento ambiental tem que ter finalidade de evitar danos ao meio ambiente e não se tornar um entrave ao desenvolvimento de toda uma nação.

A partir da LC 140/2011, os Estados passam a ter competência geral para o licenciamento ambiental e para o exercício de controle e fiscalização das atividades e empreendimentos, nos termos do art. 8º, XIII e XIV da própria lei. As competências da União e dos Municípios são enumerativas. O Estado passa a exercer o protagonismo no que tange a políticas de licenciamento e fiscalização ambiental e isso inclui a atuação dos Ministérios Públicos estaduais que passam a ter indubitavelmente competência para fiscalizar empreendimentos que no passado eram discutidos como de competência da União.

Extensão do impacto ambiental

Destarte, nota-se que a despeito da titularidade do bem, que no caso dos recursos minerais é da União, ou seja, teoricamente de competência licenciatória do IBAMA, quem define a competência para licenciamento ambiental é a extensão do impacto ambiental do empreendimento ou atividade. Logo, por exemplo, na extração de areia, pelos danos ambientais causados serem de impacto meramente local, a competência é do município, como foi julgado pelo Egrégio Tribunal de Justiça de Minas Gerais neste respeitável acórdão:

"MANDADO DE SEGURANÇA. NEGATIVA DE AUTORIZAÇÃO DE EXTRAÇÃO DE AREIA. COISA JULGADA POR AÇÃO POSTERIOR. PROIBIÇÃO DE USO DE FERRAMENTAS. DISCIPLINA SOBRE MEIO AMBIENTE E NÃO DE MINERAÇÃO. MUNICÍPIO. COMPETÊNCIA CONCORRENTE. A simples negativa de alvará para extração de areia não define relação jurídica que provoque coisa julgada, embora fundada em idêntico dispositivo legal. A não concessão de exploração de extração de areia em via fluvial do Município, com uso de instrumentos de sucção e bombeamento, não é disciplina sobre mineração, mas de proteção do meio ambiente, também da competência do Município. (MINAS GERAIS, TRIBUNAL DE JUSTIÇA, AC. 1.0386.08.008488-5/001, Rel: Des. Ernane Fidélis)".

A Justiça Estadual, e por consequência o Ministério Público local, está mais próximo do dano ambiental e graças a isso tem maiores facilidades para a própria instrução do processo, impedindo que haja impunidade. A Justiça Federal está restrita a cidades de maior porte e muitos danos ambientais ocorrem na zona rural, afastada de centros urbanos.

Na Constituição de 1969, é interessante observar que o seu artigo 126 determinava que o Ministério Público local agisse como representante da União em suas causas, em ações de seu interesse, nas comarcas do interior onde fosse domicílio da parte contrária. Isso proporcionava uma melhor aplicação da Lei pela proximidade das partes, principalmente a proximidade sociocultural o que indica uma maior sensibilidade no julgamento e uma maior compreensão dos fatos, inclusive pelo conhecimento próprio dos membros do Parquet em relação aos fatos.

O Art. 10 da Lei 6.938/81 condicionava a construção, instalação, ampliação e funcionamento de estabelecimentos e atividades utilizadoras de recursos ambientais, considerados efetiva e potencialmente poluidores à prévia obtenção de licenças perante o competente órgão estadual, mas também, de forma supletiva perante o IBAMA. Com a edição da Lei Complementar 140/2011, este artigo ganhou novo texto especificando tão somente a necessidade de licenciamento ambiental, não definindo nenhum órgão específico como outrora era feito.

Conclusão

É notório o protagonismo do Ministério Público no que tange à proteção ao meio ambiente, já que o mesmo possui esta função determinada pela Constituição e pela Lei da Ação Civil Pública. Porém, há a omissão da legislação em distinguir a competência dos MP Estaduais e Federal em relação a causas ambientais.

Contudo, a Constituição determina a competência comum dos entes federados para a tutela do meio ambiente. Apesar disto, mesmo persistindo discussões fundadas na competência do MPF para causas minerárias pelo fato do minério ser bem da união e pela competência legislativa da União, não há de se afirmar que mineração deixe de ser causa ambiental, caracterizando-se como parte integrante do que rege a Constituição sobre competência comum, ou seja, meio ambiente. O MPF passa a ser postulante legítimo quando se trata do bem econômico mineral e quando se trata do meio ambiente.

É importante ressaltar a importância do respeito ao pacto federativo, evitando a concentração excessiva de competências nas mãos da União. A União não tem a capacidade de estar presente e tomar ciência do que ocorre em cada localidade do Brasil, sendo essa tarefa adequada para os governos municipal e estadual que estão mais próximos de onde ocorrem os fatos. Cada comarca do interior tem um Promotor de Justiça mas nem toda localidade tem a presença de um Procurador Federal, logo, o Ministério Público Estadual tem maior facilidade em ter ciência de fatos danosos ao meio ambiente, incluindo aqueles derivados da mineração.

Adicionalmente, a Lei da Ação Civil Pública prevê a possibilidade de litisconsórcio ativo dos MP Estaduais e Federal em determinadas ações, nas quais se incluem as relativas ao meio ambiente, possibilitando melhor fiscalização.

Houve acerca da extensão do impacto ambiental a conclusão de que quando se trata de atividade minerária de impacto local, a competência para dispor sobre o tema é local, permitindo àqueles que cercam a área de exploração mineral de poder para evitar os danos ambientais na sua região, entendimento consolidado com a Lei Complementar nº140/2011 que define a competência licenciatória, por exemplo, ao município em caso de extração de areia.

Logo, a partir do presente estudo foi possível perceber, de forma clara, que a competência e legitimidade para tratar de questões ambientais relativas à mineração é comum ao Ministério Público Estadual e ao Federal, pois se entende que a despeito do minério ser bem da União, o meio ambiente é de propriedade de todos e por todos devem ser fiscalizado, cabendo, com fulcro na Constituição, a participação ativa de todos os entes na interminável luta para preservação do meio ambiente.

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