Consentimento livre e esclarecido e avaliação do grau de expressão de coerção em assistência (Português)

AutorAna Luiza Portela Bittencourt - Alberto Manuel Quintana - Maria Teresa Aquino de Campos Velho - José Roberto Goldim - Laura Anelise Faccio Wottrich
Páginas81-89

Page 83

1. Introdução

A designação "Consentimento Informado" foi criada nos EUA em 1957 sendo resultado de uma decisão judicial. No Brasil, o uso do consentimento informado começou a ser normatizado apenas na década de 70 (Goldim, 2002). Para O’neil (2004), ainda que, cada vez mais, introduzam-se procedimentos adicionais e formulários de consentimento explícito para as intervenções, esse sempre dependerá do entendimento do que permanece implícito: a vontade do paciente.

Beauchamp e Childress (2002) afirmam que o consentimento livre e esclarecido tem como principal função tornar possível e proteger a escolha autônoma dos sujeitos. Entende-se que "o respeito à autonomia e à dignidade de cada um é um imperativo ético e não um favor que podemos ou não conceder uns aos outros" (Freire, 1996, p.59). Assim, o processo de consentimento livre e esclarecido é efetivado quando o paciente, tendo entendimento da situação, e livre de qualquer controle por parte de outro, intencionalmente autoriza o profissional a fazer algo (Beauchamp & Childress, 2002).

O documento é apenas uma parte desse procedimento, o qual envolve a informação dos fatos e o curso da ação. Nesse processo não deve haver coerção ou manipulação e o sujeito deve ser capaz de consentir. O consentimento livre e esclarecido existe para garantir o respeito aos valores do paciente e facilitar a tomada de decisão racional (Terry, 2007).

Ao ser convidado a consentir com um procedimento assistencial ou de pesquisa o sujeito deve, ao menos, atender a duas condições: a capacidade para entender e decidir e a voluntariedade (Goldim, 2002). Uma decisão voluntária é aquela tomada livre de qualquer influência ou pressão. Já capacidade é um conceito ligado à autonomia e que, segundo Terry (2007), implica que o paciente consiga compreender e sopesar as informações fornecidas pelo médico para tomar sua decisão.

No campo da psicologia a capacidade tem sido associada ao nível de desenvolvimento psicológico-moral do indivíduo (Ramos, 2008). Loevinger (1966) desenvolveu um instrumento que visava avaliar o desenvolvimento psicológico-moral das pessoas. Sua classificação de desenvolvimento do ego estabelece sete níveis: pré-social, impulsivo, oportunista, conformista, consciencioso, autônomo e integrado (Protas, 2010). Esta classificação é utilizada com a finalidade de avaliar se o sujeito apresenta um nível de desenvolvimento psicológico-moral que o capacite a tomar decisões autônomas.

Percebe-se a tomada de decisão e os elementos relacionados a ela, como aspectos relevantes para a validade do processo de consentimento livre e esclarecido. Devido a isso, considera-se que esses elementos devem ser também analisados ao estudar-se tal processo.

A compreensão a respeito da percepção, pelo sujeito, de que foi coagido ao expressar-se é relevante na medida em que a área da saúde caminha no sentido de valorizar as decisões voluntárias e autônomas dos pacientes. Desse modo, é importante entender a forma como esses indivíduos se sentem em relação ao acolhimento de suas escolhas pela equipe.

Page 84

A coerção é entendida por Piaget (1980) como a relação social onde existe um elemento de respeito unilateral, de autoridade ou prestígio. Numa relação coercitiva tem-se a imposição de regras que devem ser obedecidas sem questionamento.

No entanto, a percepção de coerção se coloca como um conceito um tanto diverso daquele de coerção propriamente dita (Monahan et al., 1995). O instituto MacArthur Research Network on Mental Health and the Law define a percepção de coerção como o oposto da percepção de autonomia do paciente. Dessa forma, sentir-se coagido durante a internação, psiquiátrica, no caso dos estudos conduzidos por este grupo, significa que o paciente percebeu que não teve influência, controle, liberdade ou escolha em relação à mesma, ou que não tomou a decisão de ser hospitalizado (Gardner et al., 1993).

As pesquisas sobre percepção de coerção são importantes para compreender o impacto da pressão exercida pela equipe sobre o paciente (Stanhope, Marcus & Solomon, 2009). Pacientes que relataram desconforto devido a comportamentos coercitivos podem acabar não seguindo as orientações médicas, ou não procurando mais auxílio médico, mesmo...

Para continuar leyendo

Solicita tu prueba

VLEX utiliza cookies de inicio de sesión para aportarte una mejor experiencia de navegación. Si haces click en 'Aceptar' o continúas navegando por esta web consideramos que aceptas nuestra política de cookies. ACEPTAR