Códigos de Governo das Sociedades da Comissão do Mercado de Valores Mobiliários e do Instituto Português de Corporate Governance ? Desenvolvimentos Recentes

AutorAlexandre Mota Pinto - Manuel Barbosa Moura
Páginas136-141

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1. O código de governo das sociedades da comissão do mercado de valores mobiliários
1.1. Base legal e regulamentar dos códigos de governo das sociedades

A obrigação de divulgação de informação relativa ao governo das sociedades está legalmente ancorada ao artigo 245º-A do Código dos Valores Mobiliários (o «CVM»). Dispõe esta norma que as sociedades emitentes de acções admitidas à negociação em mercado regulamentado situado ou a funcionar em Portugal divulgam, em capítulo do relatório anual de gestão, um relatório detalhado sobre a estrutura e as práticas de governo societário”.

O relatório anual sobre governo das sociedades insere-se, assim, no dever de divulgação do relatório de gestão da sociedade (artigo 245.º, n.º 1, alínea a), do CVM), constituindo um capítulo deste, que deve conter as informações previstas nas várias alíneas do artigo 245º-A, nº 1.

Aquela injunção legal é concretizada pelo Regulamento da CMVM n.º 4/2013 (o «Regulamento”), cujo artigo 1º reforça a obrigatoriedade de divulgação do relatório de governo, que deve respeitar a «sistematização prevista neste Regulamento ». Como podemos ler no n.º 4 deste artigo 1º, «Para efeitos do disposto nos números anteriores o relatório de governo societário inclui os elementos e obedece ao modelo constante do Anexo I do presente regulamento que dele faz parte integrante».

Os artigos 245º-A do CVM, alíneas n) e o), e 2º do referido Regulamento, prevêem o «acolhimento» ou «adopção» de um código de governo das sociedades pelos emitentes, dispondo aquela norma regulamentar que «Os emitentes de ações admitidas à negociação em mercado regulamentado situado ou a funcionar em Portugal adotam o Código da CMVM ou um código de governo societário emitido por entidade vocacionada para o efeito».

Portanto, a lei e a própria CMVM reconhecem a possibilidade de escolha de um outro código de governo societário, além do código da CMVM, emitido por entidade «vocacionada para o efeito». Apesar do carácter genérico desta exigência vocacional, parece claro que a referida entidade deve cumprir, pelo menos, dois requisitos essenciais: independência em relação aos emitentes e a outros interesses particulares; «Expertise» publicamente reconhecida, em matéria de governo das sociedades. Como veremos, esta faculdade de emissão de um outro código veio a ser utilizada pelo Instituto Português de Corporate Governance (o «IPCG»), entidade que preenche os referidos requisitos.

Em termos de sistematização, o relatório de governo societário divide-se em duas partes: a primeira referente à informação relevante a cuja difusão e publicação a sociedade se encontra adstrita; a segunda parte, por sua vez, referente à avaliação do nível de

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cumprimento do código de governo adoptado (v., a este propósito, Joana TORRES EREIO, O novo Código de

Governo das Sociedades da CMVM, in: Actualidad Jurídica, n.º 37, Uría Menéndez, 2014, pág. 155). De um simples olhar pelo «Modelo de Relatório de Governo Societário» (anexo ao Regulamento nº 4/2013), resulta evidente a preponderância da parte relativa à divulgação da informação relevante, aliás, de acordo com a ideia de que a informação é um bem essencial ao bom funcionamento do mercado.

Ideia que já constava do preâmbulo do anterior Regulamento da CMVM n.º 1/2010 («... a conjuntura recente veio tornar ainda mais evidente que a informação é fundamental para assegurar a transparência dos mercados, em particular a que respeita ao Governo das Sociedades, mas só será eficaz se for completa, estiver actualizada e for prestada de forma sistematizada»), e que também consta do preâmbulo do actual Regulamento da CMVM nº 4/2013: «O regime relativo ao governo das sociedades encontra-se (...) assente na imposição às sociedades emitentes (...) do dever de prestação e divulgação de informação por via da elaboração de um relatório sobre a estrutura e as práticas de governo societário...».).

Antes de analisarmos o código de governo societário da CMVM, cujo grau de cumprimento, como vimos, os emitentes devem mencionar na segunda parte do relatório de governo, cumpre fazer uma breve nota sobre a sua natureza jurídica.

Conforme a denominação constante de subtítulo do próprio Código da CMVM, estamos perante um leque de recomendações. Por conseguinte, os seis pontos por que se estende este rol de recomendações representam a codificação de um conjunto de normas destituídas de sanção jurídica e cujo cumprimento não pode ser coercivamente exigido. Estamos, pois, perante normas de soft law.

Em coerência com esta natureza jurídica, o código, cuja adopção é voluntária (cfr. artigo 2.º, n.º 1 do Regulamento), acolhe o princípio «comply or explain» (artigo 1.º, n.º 3 do Regulamento). Esta opção pela justificação sobre o não cumprimento deve demonstrar que a solução alternativa é adequada aos princípios de bom governo, em termos que a tornem materialmente equivalente ao cumprimento das recomendações.

1.2. Evolução do código da CMVM, entre 2010 e 2013

Destacamos agora as principais alterações resultantes da revisão do código de governo das sociedades da CMVM de 2010 que deu origem a um novo código de governo das sociedades da CMVM, em 2013 (o «código CMVM 2013»). Referiremos, de modo conciso, as mais relevantes alterações nas seguintes matérias: assembleia geral, órgãos sociais e remunerações, e ainda conflitos de interesses e transacções com partes relacionadas.

Refira-se, antes de mais, que, no que toca aos deveres de informação, o código substituiu a técnica de enumeração de uma série de deveres específicos de informação e divulgação (previstos no nº III 1.2. do código de 2010) por uma recomendação de carácter geral relativa ao dever das sociedades de «proporcionar, através do seu sítio na Internet, em português e inglês, acesso a informações que permitam o conhecimento sobre a sua...

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