Brasil: O Documento Eletrônico como Meio de Prova no Brasil.

AutorIvo Teixeira Gico Junior
CargoAdvogado, bacharel pela Universidade de Brasília e mestre com honras pela Columbia University (EUA)
Páginas45

O Documento Eletrônico como Meio de Prova no Brasil [1].

Ivo Teixeira Gico Junior [2].

  1. Introdução;

  2. Conceitos Básicos;

    2.1. A Prova como Conceito Jurídico;

    2.2. O Conceito de Documento;

    2.3. O Conceito de Documento Eletrônico;

  3. O Documento Eletrônico como Meio de Prova;

    3.1. O Documento Eletrônico como Documento Probatório;

    3.2. A Questão do Suporte Informático;

    3.3. A Autenticidade do Documento Eletrônico;

  4. A Assinatura Eletrônica;

    4.1. A Função da Assinatura;

    4.2. A Assinatura Eletrônica;

    4.3. A Criptografia;

    4.4. A Assinatura Digital;

    Bibliografia

  5. Introdução

    O uso cada vez mais amplo dos computadores na vida social e, em particular, a difusão das transferências eletrônicas de fundos, o home banking, a explosão da Internet e o comércio eletrônico, nos leva à incontestável conclusão de que cedo ou tarde teremos de nos valer de algum tipo de documento proveniente de um sistema de elaboração eletrônica, seja ele o recibo de pagamento emitido por um terminal eletrônico de um banco, um ingresso para cinema ou teatro comprado on-line, a inscrição para um concurso público cuja taxa foi debitada automaticamente em seu cartão de crédito, etc. Mesmo na prática diária dos juristas o documento eletrônico já representa um avanço; a maioria dos Tribunais já disponibilizou sua jurisprudência e acompanhamento processual pela Internet. E a cópia impressa de julgados, ainda que sem autenticação, é aceita pelos próprios Tribunais para caracterizar divergência de julgados, desde que indicada a fonte.

    Os exemplos poderiam continuar de forma indeterminada, sem esgotar as possibilidades atuais e as que estão nas incubadoras das empresas de tecnologia. Os vários setores da vida social dependerão, em maior ou menor grau, dos chamados documentos eletrônicos.

    Alguns dirão que se trata de um fenômeno recente, mas isto não é verdade. Há anos são utilizados terminais bancários para a realização de transferências de fundos, assim como são utilizados sistemas informatizados para a realização de contrato internacionais de todos os tipos, apenas o fenômeno não era tão abrangente e generalizado como hoje. E parece-nos não ser mais reversível, uma vez que o computador é hoje a única ferramenta produzida pelo homem em condições de satisfazer as cada vez maiores e mais sofisticadas exigências de todos os componentes sociais. A sociedade moderna estruturou-se de forma indissociável sobre a tecnologia dos computadores e dos aparelhos eletrônicos. Não é difícil prever que, em breve período de tempo, toda a atividade de armazenamento de documentação se desenvolverá, salvo casos excepcionais, de forma digitalizada. Conseqüentemente, o dito documento cartular, isto é, o documento redigido pelas formas tradicionais, perderá grande parte de seu uso e importância social, em favor do documento eletrônico.

    Um fenômeno social de tal magnitude impõe análise jurídica aprofundada. Urge, em outros termos, indagar-se qual a relevância jurídica do documento formados por um computador, qual o valor jurídico do documento eletrônico.

    Este exame deve levar em conta um duplo, e às vezes, contraposto interesse: de um lado a necessidade de permitir a mais eficaz e vasta utilização dos novos meios tecnológicos; por outro lado, a necessidade de tutelar adequadamente a confiança dos agentes econômicos e, de forma geral, de todos os cidadãos, na segurança dos novos tipos de documento.

    À luz de tais exigências é necessário certificar qual é atualmente, em face do Direito positivo vigente, a disciplina dos documentos eletrônicos; em segundo lugar, qual a eventual normativa poderia ou deveria ser emanada para uma melhor tutela do duplo interesse supra mencionado.

    O presente artigo debate tais questões, não com a pretensão de fornecer respostas ou estabelecer novas verdades, mas tão somente como uma primeira frase de um necessário diálogo que se inicia. Sendo assim, tratamos de esmiuçar principalmente a parte conceitual relacionada ao documento eletrônico, o substrato comum e essencial para que a discussão jurídica prossiga de forma produtiva e em termos comuns. Utilizamos, sempre que conveniente, o apoio da doutrina estrangeira, notadamente a italiana, francesa e americana. As utilizaremos ora pela proximidade jurídica de nossos sistemas, ora pela relevância que desempenham no campo das novas tecnologias, sem, contudo, realizarmos um verdadeiro estudo comparado.

    Tentaremos superar alguns empecilhos levantados por juristas pátrios para a perfeita utilização dos documentos eletrônicos no Direito brasileiro, bem como uma breve análise do sistema de assinatura digital que promete solucionar grande parte das celeumas. A partir dos conceitos, novos e clássicos, demonstraremos como é perfeitamente possível a utilização dos documentos eletrônicos como meio de prova em um Tribunal brasileiro.

  6. Conceitos Básicos

    2.1. A Prova como Conceito Jurídico

    O vocábulo prova é plurissignificativo, tanto na linguagem popular quanto na científica. Em geral, por prova entende-se tudo aquilo que é capaz de demonstrar a veracidade ou autenticidade de algo. Não se fala de prova senão a respeito de algo que venha afirmado, para provar-lhe exatidão. Na ciência é tudo aquilo que dá base de sustentação a uma dada afirmação científica e que pode ser repetida por qualquer outro cientista, para que alcance o mesmo resultado afirmado, desde que realizado nos mesmos termos.

    No Direito, podemos dizer que o termo também é plurissignificativo, abrangendo tanto a atividade procedimental com o fim de ministrar ao juízo os elementos de convicção acerca da veracidade ou verossimilhança[3] dos fatos jurídicos alegados em um dado processo, quanto o resultado desta atividade mesma. Pelo menos essa utilização dúbia é corrente no meio jurídico[4], e para efeitos de um estudo dogmático se faz necessária a distinção entre prova, meio de prova, motivo de prova e produção de prova.

    José Frederico Marques[5] diz que prova é o elemento instrumental para que as partes influam na convicção do juiz sobre os fatos que afirmaram como base de sustentação de suas pretensões, e o meio de que se serve o magistrado para averiguar a respeito dos fatos em que os titulares dos interesses em conflito fundam as suas alegações.

    Pinto Ferreira[6] afirma que prova é o modo objetivo pelo qual o espírito chega ao conhecimento da verdade, convencendo-se através da persuasão. A prova referir-se-ia ao ato de convencer outra pessoa de que se conhece a verdade de determinado fato, e o meio de prova a modalidade mediante a qual a prova é produzida, seria o instrumento material e processual encaminhado para o processo a fim de produzir na consciência do juiz a verdade dos fatos[7].

    Para Pontes de Miranda[8], meio de prova é a fonte probante, o meio pelo qual o juiz recebe os elementos ou motivos de prova. Já elementos ou motivos de provas seriam informes sobre os fatos, ou julgamentos sobre eles, que derivariam daqueles meios; e a atividade para entregar ao juiz os meios de prova seria a produção da prova.

    Na realidade, tudo que os doutrinadores têm discutido a respeito do significado do significante 'prova' é mera regra de utilização da palavra. Não há no mundo fenomenológico qualquer dificuldade em se enxergar o que venha a ser prova, ou o que é provar algo em juízo. Para superar esta celeuma que mais nos parece questão de padronização do que uma dificuldade técnica propriamente dita, adotaremos noções básicas dos vocábulos acima expostos. Como segue.

    Prova é a representação de um fato. Destarte, por prova entendemos as afirmações ou representações que, apresentadas, após análise cognitiva, são capazes de alterar a convicção do órgão julgador acerca dos fatos controversos ou não suficientemente esclarecidos.

    Provar é verbo e significa o ato de demonstrar a alguém, no caso do Direito, ao juiz, a veracidade ou verossimilhança de uma dada alegação.

    Quando se fala em meio de prova o foco da atenção é deslocado para o tipo de objeto em que consiste a prova. O meio de prova é a forma pela qual a alegação e representações são formuladas e apresentadas. São vários os meios de prova: os documentos, os testemunhos, instrumentos apresentados, vistorias, etc. Refere-se, pois, à forma pela qual o juízo tomará conhecimento do suporte fático das alegações discutidas.

    Produção da prova é o ato de trazer a juízo a prova pré-constituída ou de efetivamente produzir o elemento que integrará o processo como prova.

    E por último, motivo de prova é toda e qualquer alegação contestada por uma das partes ou que não está satisfatoriamente clara no processo na visão do juiz[9]. Refere-se aos fatos pertinentes ao processo, os fatos jurídicos relevantes e as alegações deles decorrentes, que devem ser idoneamente provadas.

    Por força da tradição elíptica do português, é provável que utilizemos o termo prova para significar um ou mais dos sentidos acima expostos, mas sempre que possível, tentaremos manter o rigor científico na denominação utilizada.

    2.2. O Conceito de Documento

    A noção mais básica que se tem de documento é qualquer base de conhecimento, fixada materialmente e disposta de maneira que se possa utilizá-la para extrair cognição do que está registrado. Aproxima-se muito da noção de registro.

    Em sentido amplo, é toda representação material destinada a reproduzir determinada manifestação do pensamento, como uma vox mortua. Abarca o mais amplo espectro de sinais, sendo o mais comum deles a escrita[10]. A palavra documento procede de docere, que significa instruir. Genericamente é a coisa material na qual a atividade humana imprime vestígios ou sinais para efeito de comunicação de determinados conhecimentos.

    Estritamente falando, é a peça escrita ou gráfica que exprime algo de valor jurídico para esclarecer, instruir ou provar o que se alegou no processo pelas partes em lide[11].

    Na doutrina italiana, utiliza-se uma definição extremamente geral do que venha a ser a prova documental, segundo Camoglio, Ferri e Taruffo[12], à categoria de prova documental...

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